"Caro leitor, quando escrevemos, estamos produzindo
para nós. É por isso que dificilmente encontraremos na parte
introdutória de um livro uma dedicatória voltada para você,
tampouco ao linguista, menos ainda ao crítico literário.
Porém a obra que era nossa, ao ser publicitada, passa
a ser de todos, que irão degustá-la de um modo operante
que melhor lhe convier e satisfazer. Daí, uma obra destinada
à fogueira, esquecida, estrangulada, merecida.
Este livro que ora passa pelas suas mãos não foge
a este princípio: é uma obra que o autor fez para ele,
mas, transformada pelo desejo de aparecer, está sendo
publicizada a partir de sua adesão e financiamento do
Programa Municipal de Incentivo à Cultura de Uberlândia
(PMIC/Udia), pelo edital PMIC de 2012.
Antes de situarmos a referência deste livro, tomemos
alguns autores que influenciaram minha geração (anos de
1970, 80 e 90) para a produção poética. Neruda, ao escrever
Canto Geral, toma um fio condutor de poesia engajada, a
qual narra sua trajetória de desbravador de sua América e de
seu Chile. Em outra obra (20 poemas de amor y uma canción
desesperada), o autor (des)toa um lirismo que atua em nome
do amor à terra, à natureza, à sua Matilda, conduzindo seu
cantar lírico por reflexões de cunho subjetivista.
O grande poeta brasileiro Schmidt, em seus Poemas
de Amor, atua também de forma lírica, para além de
um subjetivismo enfadonho, como podemos perceber 12
em seus versos “O amor é a tarde fresca quando nem as
árvores bolem... porque o vento acabou e a luz não arde.”
Então leitor, verificamos que tratar de amar e amor,
necessariamente, não passa pela pieguice ou pela breguice,
embora tais estilos tenham vasto amparo popular.
Finalmente, o famoso crítico literário norte-americano
que se aventurou (e desventurou no campo da poética):
Pound, que busca reinventar a poesia por via de uma
métrica equalizada, um esmero nas palavras de dar inveja
ao melhor ourives. A olho nu, não se notam imperfeições em
suas produções, elas são desenhadas para iluminar os olhos
do leitor, entretanto elas encontram dificuldades em atingir
o seu espírito.
Tratei de três autores, de cuja vasta produção
escolhi quatro obras para mostrar a você que existe um
fio condutor articulado, disciplinado, marcado por uma
horizontalidade consensuada, ora com uma metodologia
ideogrâmica, tipo cartesiana (Pound), ora dialética (Neruda),
ora descompromissada (Schmidt). São escolhas, caro leitor,
e este autor que ora escreve, fez uma escolha que explicito a
seguir.
Os textos poéticos que você lerá não têm uma
organização disciplinada. Não seguem a um fio condutor,
não é que abrace uma desorganização, fez-se somente
uma opção localizada em seu tempo de escrita, portanto
ele é regido aleatoriamente, que obedece a uma estrutura
informal, espontânea, compondo um movimento
caótico, que não chega, entretanto, a ser o caos, ou a ser
desagregador.
As escritas não obedecem a um ritmo certo. Você
encontrará poemas AABBC (melodioso), ou poemas RRRRR
(ruidoso). Rimas ricas, rimas pobres, versos brancos. Você
irá encontrar um poema com um ritmo lapidado, você
encontrará de forma exagerada um poema sem ritmo,
resíduos que pretendem quebrar a sua organização de
leitura.
De repente, um poema engajado na luta pela
liberdade, na ansiedade pelo alimento (comida, música,
teatro, arte), depois, um poema lírico, que busca dominar o
subjetivismo do poeta, mais adiante, poemas com histórias
de vida... Diferentemente dos autores anteriores em suas
escolhas por uma organização sem limalhas, busquei um
modelo composto por areia, pó de giz; deletei o equalizador,
reduzi a luminosidade; a grama macia foi substituída por
palhas de aço.
A nossa intenção, caro leitor, é a de pegar você
de supetão. Não sei se conseguirei o intento, mas, sem
narcisismo, reconheçamos que toda anarquia exige
uma organização naquilo que, se não bem visto, parece
desorganização."
Bosco de Lima
Uberlândia, julho de 2013.
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