terça-feira, 10 de dezembro de 2013

    "Caro leitor, quando escrevemos, estamos produzindo 
para nós. É por isso que dificilmente encontraremos na parte 
introdutória de um livro uma dedicatória voltada para você, 
tampouco ao linguista, menos ainda ao crítico literário.
    Porém a obra que era nossa, ao ser publicitada, passa 
a ser de todos, que irão degustá-la de um modo operante 
que melhor lhe convier e satisfazer. Daí, uma obra destinada 
à fogueira, esquecida, estrangulada, merecida.
    Este livro que ora passa pelas suas mãos não foge 
a este princípio: é uma obra que o autor fez para ele, 
mas, transformada pelo desejo de aparecer, está sendo 
publicizada a partir de sua adesão e financiamento do 
Programa Municipal de Incentivo à Cultura de Uberlândia 
(PMIC/Udia), pelo edital PMIC de 2012. 
    Antes de situarmos a referência deste livro, tomemos 
alguns autores que influenciaram minha geração (anos de 
1970, 80 e 90) para a produção poética. Neruda, ao escrever 
Canto Geral, toma um fio condutor de poesia engajada, a 
qual narra sua trajetória de desbravador de sua América e de 
seu Chile. Em outra obra (20 poemas de amor y uma canción 
desesperada), o autor (des)toa um lirismo que atua em nome 
do amor à terra, à natureza, à sua Matilda, conduzindo seu 
cantar lírico por reflexões de cunho subjetivista. 
     O grande poeta brasileiro Schmidt, em seus Poemas 
de Amor, atua também de forma lírica, para além de 
um subjetivismo enfadonho, como podemos perceber 12
em seus versos “O amor é a tarde fresca quando nem as 
árvores bolem... porque o vento acabou e a luz não arde.” 
Então leitor, verificamos que tratar de amar e amor, 
necessariamente, não passa pela pieguice ou pela breguice, 
embora tais estilos tenham vasto amparo popular.
     Finalmente, o famoso crítico literário norte-americano 
que se aventurou (e desventurou no campo da poética): 
Pound, que busca reinventar a poesia por via de uma 
métrica equalizada, um esmero nas palavras de dar inveja 
ao melhor ourives. A olho nu, não se notam imperfeições em 
suas produções, elas são desenhadas para iluminar os olhos 
do leitor, entretanto elas encontram dificuldades em atingir 
o seu espírito.
    Tratei de três autores, de cuja vasta produção 
escolhi quatro obras para mostrar a você que existe um 
fio condutor articulado, disciplinado, marcado por uma 
horizontalidade consensuada, ora com uma metodologia 
ideogrâmica, tipo cartesiana (Pound), ora dialética (Neruda), 
ora descompromissada (Schmidt). São escolhas, caro leitor, 
e este autor que ora escreve, fez uma escolha que explicito a 
seguir.
     Os textos poéticos que você lerá não têm uma 
organização disciplinada. Não seguem a um fio condutor, 
não é que abrace uma desorganização, fez-se somente 
uma opção localizada em seu tempo de escrita, portanto 
ele é regido aleatoriamente, que obedece a uma estrutura 
informal, espontânea, compondo um movimento 
caótico, que não chega, entretanto, a ser o caos, ou a ser 
desagregador.
     As escritas não obedecem a um ritmo certo. Você 
encontrará poemas AABBC (melodioso), ou poemas RRRRR 
(ruidoso). Rimas ricas, rimas pobres, versos brancos. Você 
irá encontrar um poema com um ritmo lapidado, você 
encontrará de forma exagerada um poema sem ritmo, 
resíduos que pretendem quebrar a sua organização de 
leitura. 
     De repente, um poema engajado na luta pela 
liberdade, na ansiedade pelo alimento (comida, música, 
teatro, arte), depois, um poema lírico, que busca dominar o 
subjetivismo do poeta, mais adiante, poemas com histórias 
de vida... Diferentemente dos autores anteriores em suas 
escolhas por uma organização sem limalhas, busquei um 
modelo composto por areia, pó de giz; deletei o equalizador, 
reduzi a luminosidade; a grama macia foi substituída por 
palhas de aço.
    A nossa intenção, caro leitor, é a de pegar você 
de supetão. Não sei se conseguirei o intento, mas, sem 
narcisismo, reconheçamos que toda anarquia exige 
uma organização naquilo que, se não bem visto, parece 
desorganização."
Bosco de Lima 
Uberlândia, julho de 2013.

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